quarta-feira, 24 de novembro de 2010

A Crença em Deus em uma Era de Ciência

A Obra de John Polkinghorne, Belief in God in an Age of Science, baseado em suas Terry Lectures na Universidade de Yale, explora as consequências radicais das revoluções recentes na ciência para o conflito entre o ceticismo e a fé. Aqueles familiarizados com Polkinghorne - um eminente físico da Universidade de Cambridge, que acontece também ser um sacerdote anglicano - vai encontrar aqui uma destilação das reflexões anteriores, bem como alguns novos argumentos. Teólogos e cientistas vão encontrar aqui alimento para o pensamento, e filósofos deveriam prestar atenção - para o casamento de John Polkinghorne da percepção científica e teológica,que bem pode pressagiar uma nova fase "pós-secular" no pensamento ocidental.

O Ocidente está entrando em um novo capítulo em sua história intelectual, e John Polkinghorne é um de um punhado de cientistas que já tenham, por assim dizer, conseguido ler algumas páginas à frente no texto. Belief in God in an Age of Science não é uma mera reedição da cansativa controvérsia “religião x ciência”. O livro vale a pena ler, não só pelos seus muitos insights, mas também porque pressagia um novo estilo de pensamento que nos leva além, não só do moderno, mas também do pós-moderno – uma sofisticada e cientificamente informada perspectiva que não deixa de ser animada por uma firme e racionalmente suportada religiosa.

Como físico, Polkinghorne entende o que muitos pensadores ocidentais, sem formação científica, ainda têm de perceber: que a ciência recente abalou os fundamentos materialistas da visão de mundo secular moderna. Filosofia moderna, de Hobbes em diante, tomou o rumo de um científico mecanicismo/materialismo, a partir de uma visão do universo como meramente "matéria e movimento". No entanto, ultimamente a física e a cosmologia já correram adiante, deixando mais esta perspectiva para trás.
Uma característica fundamental do cosmos apresentado pela nova física é a sua amistosidade a Deus. A mecânica newtoniana levou à visão de um universo mecânico menos o Relojoeiro. Mas quanto mais os cientistas investigaram a evolução cósmica, mais eles se deram conta, na frase de Fred Hoyle, que o universo é um "arranjo planejado”. Para a vida humana emergir, o mecanismo cego da seleção natural não foi suficiente; pelo contrário, as leis da física tinham que ser programadas minuciosamente desde o momento do big-bang. Uma variação infinitesimal em qualquer uma das constantes físicas teria impedido a vida.

Nos dias presentes a cosmologia, portanto, deixa-nos com uma escolha: ou o universo foi criado por um designer inteligente, ou é uma coincidência enorme e incrível de forma que nós mal podemos imaginar. Versando sobre o filósofo John Leslie, Polkinghorne escreve que existem duas possibilidades lógicas: "que Deus é real, e/ou existem muitos e variados universos", sendo este último invisível, indemonstrável e, provavelmente, não detectável em princípio. Polkinghorne não insiste no ponto. Embora a hipótese de Deus não seja "logicamente coercitiva", como ele coloca, facilmente se levanta contra a alternativa.

No entanto, o interesse de Polkinghorne não está em provar a existência de Deus, mas sim em mostrar como a teologia pode "reivindicar" um "entendimento intelectualmente satisfatório", completando crucialmente a ciência. Ele também procura mostrar como a teologia e a ciência, no diálogo, podem informar e corrigirem-se umas às outras. Seu alvo, em certo sentido, é a moderna formulação-padrão da relação religião-ciência, que cedeu à ciência toda a esfera da verdade objetiva e - especialmente desde Friedrich Schleiermacher – a teologia expedida cada vez mais ao subjetivismo e à especulação vazia. Quando se trata de ciência, Polkinghorne opõe-se ao positivismo ingênuo. Quando se trata de teologia, ele insiste na necessidade de uma maior preocupação com a verdade objetiva.

A ciência, Polkinghorne enfatiza, não é livre de valores, mas sim uma atividade carregada deles. Considerações tais quais a "beleza" e "elegância" da teoria são "fundamentais" para a física; o discurso científico depende de virtudes morais, como " honestidade "e "generosidade de partilha intelectual".

Mas ele resiste a qualquer noção de que a realidade é "socialmente construída". Da mesma forma, ele reprova alguma teologia de despreocupação com a verdade simples, no sentido literal do termo. Ele defende o que ele chama de "realismo crítico" e "bottom-up" [expressão que significa “emergência”, “de baixo para cima”, que na linguagem das ciências da complexidade se referem a sistemas que, pela ação de seus agentes, adquirem propriedades novas em níveis mais acima que não constam nos de baixo – Nota do Tradutor] da teologia, favorecendo interpretações bastante ortodoxas e literais dos principais mistérios cristãos, incluindo a encarnação, redenção, e até mesmo (como ele deixou claro em The Faith of a Physicist) o nascimento virginal.

Poderá a nova física gerar uma nova teologia? Polkinghorne oferece uma iluminação fascinante sobre a questão do livre-arbítrio e a divina providência, observando que o estado da arte na física - via e caos teoria quântica - tem deixado de lado o velho princípio do determinismo. Suas mais eloquentes observações referem-se ao que as leis da natureza dizem sobre o problema do mal, sugerindo que um divino "deixar-ser" é necessário para garantir a liberdade humana.

É da natureza de densos campos de neve que, por vezes, derrapam com a força destrutiva de uma avalanche. É da natureza dos leões que eles vão buscar suas presas .... é da natureza da humanidade que às vezes as pessoas vão agir com generosidade altruísta, mas por vezes com o egoísmo homicida. Que estas coisas são assim não é gratuito ou por descuido ou divina indiferença. São os custos necessários ao dom dado à criação por seu Criador de ter a liberdade de ser si mesma. Teólogos e cientistas vão encontrar alimento para o pensamento aqui, e os filósofos devem ter atenção - para o casamento de John Polkinghorne da percepção científica e teológica, que bem pode pressagiar uma nova fase "pós-secular" no pensamento ocidental.


* Resenha por Patrick Glynn - diretor adjunto da George Washington University Institute for Communitarian Policy Studies, é o autor de Deus: a Evidência - a reconciliação entre a fé e a razão no mundo atual.


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